terça-feira, 15 de julho de 2014

Eu sou negra/o, e você?

O Brasil, um país miscigenado, cujo no século XIX a maior parcela da população era negra e no século XX iniciou um processo de embranquecimento por acreditar que a mestiçagem não traria progresso ao país (HEILBORN; ARAÚJO; BARRETO, 2010), vive no século XXI uma pseudo democracia racial.
O racismo tem sua origem na elaboração expansão de uma crença que justificava a desigualdade entre os seres humanos em virtude das diferenças eminentes entre as raças humanas (GUIMARÃES, 1999). As/os africanas/os, sendo o público preferido para a exploração escravista, tornam-se alvos de uma associação onde atribuem às/aos negras/os africanas/os a inferioridade da condição estrava. Esta torna-se uma condição essencial das/os negras/os, no decorrer dos séculos e até o presente momento, onde ainda é possível observar os efeitos deste período e também as diversas formas atuais de preconceito, como o grande índice de desemprego que acomete a população negra, o genocídio de adolescentes e jovens negras/os e os baixos índices de escolaridade, se comparados à população de raça branca.
Nota-se que, durante o século XIX, raça era tida como uma categoria na qual as diferenças eram dadas ontologicamente, onde cada raça possuía uma natureza própria, que a diferenciava das demais. Assim, foi sendo construída a ideia de que o indivíduo estaria submetido às características boas ou ruins de sua raça; características que definiam o grupo (psicológicas, biológicas, sociais e de caráter):
Definia-se, assim, uma hierarquia na qual brancos e brancas de origem europeia eram entendidos como superiores (do ponto de vista moral, físico e psicológico) em detrimento dos/das indígenas autóctones, asiáticos/as e negros/as africanos/as, ainda que pelo pensamento racial, houvesse subdivisões dentro dos grupos (HEILBORN; ARAÚJO; BARRETO, 2010, p.72).
Com tais concepções, a miscigenação se tornaria degenerescente, tornando os miscigenados um grupo fraco que incorporaria as características negativas de cada grupo (HEILBORN; ARAÚJO; BARRETO, 2010).
As teorias do século XIX apresentam uma “pseudocientífica” do racialismo, que aponta para o fato de diferenças morfológicas e hereditárias serem fatores de definição para as diferenças culturais e morais entre grupos. Neste período, a ciência biológica, a partir das características morfológicas, é o que determina as diferentes capacidades das raças e a sua moralidade, levando a uma segregação entre as raças. Além da cor, a estrutura craniana e capilar, os tipos de nariz, lábios, queixo e etc. tornam-se determinantes para calcular inteligência e moral das pessoas. Tais considerações levaram à criação do índice cefálico que apontava, em uma escala evolutiva, o homem branco no topo, seguido por mulheres brancas e as outras raças em patamares descendentes, formando uma hierarquia das raças. A teoria da hierarquia racial é um fator de justificativa para as ações segregacionistas, coloniais e/ou de extermínio de populações consideradas inferiores, trazendo à tona um racismo científico, cujas consequências foram os trágicos resultados do colonialismo, racismo e do apartheid (HEILBORN; BARRETO, 2010).
Assim, a escravidão encontrou uma justificativa para a inferioridade a partir da cor e associada à moral e à capacidade intelectual da/o negra/o. É importante citar aqui as concepções de superioridade racial nos conceitos bíblicos. Temos também a teoria do poligenismo, que defendia a origem da humanidade a partir de vários lugares de forma independente, dando início a várias subespécies humanas (a teoria racialista mais radical). Não obstante, o monogenismo de teor hierárquico (teoria que aponta a humanidade como, embora indivisa, com a moral, a beleza e a capacidade de progredir como fatores determinantes das diferenças raciais e desigualdades. A partir dos conceitos de Charles Darwin, o darwinismo e o darwinismo social permitiram a integração de um sistema de pensamento que prevaleceu no século XIX: a origem das espécies (entre elas, a humana), a distinção de raças e a superioridade de umas sobre as outras. Ao final do século XIX, vimos desabrochar a antropologia moderna, que passou a defender que um elemento cultural só faria sentido quando considerado a partir da totalidade na qual faz parte. No entanto, em meados do século XX, no momento em que a antropologia social ou cultural afastava-se do conceito de raça no estudo das sociedades, assistimos ao surgimento do nazismo e das ações políticas de segregação e extermínio baseadas na raça.
Ao fazer uma análise requintada sobre a origem de cada brasileira/o, serão encontrados vestígios oriundos desta mestiçagem que somos originados, e este é um fato que deve ser considerado com grande admiração, pois vem com a proposta de sermos um país repleto de diversidades étnicas e culturais, onde o respeito a tais diversidades seja primordial. Diante disso, devemos discutir sobre o quanto somos miscigenados, e do quão “embranquecidos” estamos.

Dizemos isso em decorrência de percebermos que, em 2010, o município de Piúma tinha 18.123 habitantes, e 9.516 declararam-se brancos (52,51%), 924 negros (5,10%), 91 amarelos (0,50%), 7.559 pardos (41,71) e 33 indígenas (0,18%). Não se sabe quais critérios foram utilizados para as definições de pertencimento aos grupos raciais citados acima (sejam cor de pele, outros atributos físicos,  ou heranças genealógicas), mas é relevante a promoção de uma reflexão sobre quais atributos nos definem como pertencentes a este ou outro grupo étnico.
Referências
CONTEÚDO aberto. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Pi%C3%BAma> Acesso em: 7 de julho de 2014;
GUIMARÃES, A. S. A. COMBATENDO O RACISMO: Brasil, África do Sul e Estados Unidos. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 14, nº 39; p.103-117. Fevereiro, 1999;
HEILBORN, M. L.; ARAÚJO, L.; BARRETO, A. Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça | GPP – GeR: módulo III. Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília : Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010.

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